Nonato Guedes
Numa entrevista ao “Congresso em Foco”, o senador Rogério Carvalho (PT-SE), que assumirá em fevereiro a liderança do partido no Senado, sugeriu que o Planalto reavalie sua relação com a base de apoio no Parlamento, alegando que o governo não pode se contentar com aliados que apenas votam conforme sua orientação mas que não o defendem. Textualmente, ele enfatizou: “O governo tem uma comunicação política obstruída porque parte de sua base não defende o governo, é só base. Então, se não tem defesa política do governo, não tem promoção de imagem positiva do governo. O rateio dos espaços do Poder Executivo e dos Estados se deveu a arranjos, na maioria das vezes pouco articulados com esta preocupação de promover o governo, muito mais em garantir a presença de um parlamentar ou outro na base”. Para ele, rever essa relação é questão de sobrevivência política.
– Acho que tem que ser revisto inclusive isso. Se o governo quiser melhorar a sua performance eleitoral em 2026, ou revê isso ou vai tomar um susto quando o resultado eleitoral aparecer. Porque este segmento está com o dinheiro, está com a política, com uma estrutura política administrativa – ressalta. A mudança, de acordo com o parlamentar, não será possível apenas com uma reforma ministerial que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva estuda fazer no início do próximo ano. “Acho que as pessoas perderam a capacidade de entender que não se constrói política só mandando, mas construindo relação política. Daqui a pouco, lideranças que têm apreço vão cuidar da própria vida”. Rogério também entende que o PT precisa rever sua relação com a sociedade. “O PT tem que se reaproximar de todos os brasileiros, da classe média e das classes C e D. A gente precisa conversar mais com esse público e ter mais presença no território e não é só o PT, é uma questão de como o governo vai se aproximar dos territórios e como ele vai promover essa chegada nos territórios”, avalia. Sobre a declaração recente da presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, de que uma guinada do PT ao centro representaria “um suicídio”, o senador considera o debate entre direita e esquerda limitante e “pobre”.
Ele argumentou: “Eu acho esse debate pobre: esquerda, direita, centro, meio, lado, cima, baixo. O PT tem que buscar uma nova síntese civilizatória, que por sua vez deve estar assentada sobre a defesa da democracia, a defesa da inclusão pelo direito, a defesa da inclusão pela renda, a defesa das liberdades individuais. A gente tem que buscar um processo civilizatório e permanente e isso não quer dizer nem para esquerda nem para a direita. É defender a vida, defender a democracia. Estamos defendendo um pacto civilizatório, que a humanidade ou caminha para a civilidade ou para a barbárie”. Rogério Carvalho admite que muitas matérias relevantes foram aprovadas ao longo deste ano no Congresso Nacional, mas raciocina que há um problema crônico que é o problema da ausência de um Executivo forte. Explica que durante oito anos, praticamente, houve um Executivo com menos força do que o que historicamente se configurou: um Executivo que tem controle em todos os recursos do orçamento, um Executivo que pautava o Legislativo. No reverso da medalha, deu-se uma ampliação da força do Legislativo. “Não é ruim, por si, mas se deu uma apropriação do orçamento muito grande e, ao mesmo tempo, um descontrole e uma transferência de renda para os mais ricos nos últimos oito anos que agravou a situação fiscal do país, porque todos os cortes foram feitos na população que mais consome, que são os mais pobres”.
O futuro líder do PT adverte que os cortes foram efetuados antes da gestão do presidente Lula, em cima dos que não têm voz ou poder de lobby. “Então, reverter isso numa agenda que equilibre a distribuição de riqueza do país, tirando privilégios tributários e fiscais que o setor mais rico da sociedade brasileira ou a minoria mais rica da sociedade brasileira teve, não é uma tarefa fácil. E fazer isso sem controlar o orçamento é ainda mais difícil. Então, imagine o que o governo do presidente Lula tem enfrentado, mas a gente conseguiu aprovar muitas coisas importantes, como o arcabouço fiscal. Se você olhar do ponto de vista do que é estruturante para o país, a gente deu uma avançada grande nos últimos dois anos. E agora, com a regulamentação, a gente consolida a reforma tributária. Esse ajuste já é o segundo round da reforma fiscal. Ou seja, é colocar questões que estavam fora dentro do novo arcabouço fiscal, privilégios que estavam de fora têm que ir para dentro”, asseverou. Para ele, a maioria dos governos tem dificuldades em se comunicar nos tempos atuais. “Acho que tem uma comunicação política obstruída, sim, porque parte de sua base, e isso o governo precisa ter clareza, não defende o governo, é só base. O governo precisa compensar isso de alguma forma porque muita gente é da base mas não defende o governo. As pessoas fazem questão, votam, mas não defendem o Executivo”.
O novo líder do Partido dos Trabalhadores afirmou que, particularmente, defende a livre iniciativa e que se considera, mesmo, um social democrata atuante dentro da legenda. Independente de posicionamentos de esquerda ou de direita, o senador por Sergipe diz que sua preocupação efetiva é com o respeito à liberdade cultural dos indivíduos, da prática da vida, da defesa da democracia. “Se defender a democracia for de esquerda, eu sou de esquerda, mas tem muita gente de direita que defende a democracia. Então, esse debate é menor”. Rogério Carvalho traduz que, na atualidade, as pessoas não se reúnem mais em torno de causas e, sim, em torno de pessoas. Considera que é preciso romper o maniqueísmo político-ideológico para que não predomina no Brasil uma sociedade conservadora, sem espaços de mediação para o debate que produza rupturas concretas. “Com um cenário assim, ferrou tudo”, resumiu o parlamentar, propondo que a próxima legislatura seja pródiga em mudanças de verdade no interior da estrutura social brasileira vigente.