Nonato Guedes
Embora a eleição para presidente da Câmara Federal ainda deva acontecer no mês de fevereiro de 2025, o deputado paraibano Hugo Motta, do Republicanos, favorito para suceder Arthur Lira (PP-AL) no comando da Casa, já atua como protagonista em decisões polêmicas no âmbito da instituição, a exemplo do quiproquó envolvendo suspensão do pagamento de emendas parlamentares de comissão, determinada pelo ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal, que alegou falta de transparência na informação sobre destinação de recursos. A questão das emendas desencadeou uma crise, arrastando para o olho do furacão o próprio governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e produzindo conflitos entre Poderes, tendo despertado ironias do ministro Flávio Dino sobre a “intocabilidade” das emendas mesmo com a falta de interesse dos congressistas em oferecer transparência a respeito. Há várias propostas em discussão neste final de ano sobre o modelo adequado para funcionamento do sistema de liberação de verbas públicas para os políticos que, como se sabe, passaram a administrar o Orçamento da União.
A participação do deputado Hugo Motta nos debates em torno do assunto foi explicitada na foto de uma reunião de que ele participou com o presidente Lula na Granja do Torto, em Brasília, presente o ministro Alexandre Padilha, titular da Pasta de Relações Institucionais do governo. Oficialmente não houve declarações públicas sobre o teor da reunião e o próprio Hugo Motta, em postagem na sua rede social, preferiu dar ênfase ao seu empenho parlamentar como representante da Paraíba e dos paraibanos, não aprofundando detalhes. Mas vazou para a imprensa a versão de que o presidente da República tinha interesse em entronizar desde agora o deputado Hugo Motta no debate, ciente do ocaso que já toma conta da gestão de Arthur Lira, que, por sua vez, está preocupado em balizar seu futuro depois que voltar à planície, sendo pública e notória a sua pretensão de vir a ocupar um ministério no governo Lula para credenciar-se a projetos políticos futuros. Em todo caso, Hugo Motta, que conhece do “riscado”, não titubeou em apresentar fórmulas passíveis de conciliação dos interesses, tendo em conta a sua própria intenção de garantir um mandato tranquilo à frente da Câmara dos Deputados e explorando a sua conhecida vocação para o entendimento, forjado em cima do jogo de cintura da atividade política.
Há outros desafios aguardando a ascensão de Hugo Motta à presidência da Câmara dos Deputados – e são desafios não menos polêmicos, como o aceno que ele fez para dar partida à votação de um projeto de anistia a extremistas que participaram do 8 de Janeiro em Brasília, o que poderia beneficiar colateralmente o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), assegurando-lhe a pretendida elegibilidade que, por enquanto, está interditada. Também faz parte do contencioso na mesa de Motta a concretização de uma vaga para o PT no Tribunal de Contas da União, atendendo ponderação do presidente Lula, que lembrou a ausência de representantes do seu partido naquela Corte, que será presidida a partir de 2925 pelo ministro paraibano Vital do Rêgo, irmão do senador Veneziano Vital do Rêgo, do MDB. Não é segredo para ninguém que, dentro da estratégia para ascender ao comando da Câmara, o parlamentar do Republicanos teve que costurar variados acordos políticos nos bastidores, equilibrando-se entre aliados lulistas e aliados bolsonaristas. A “Veja” destacou, a propósito que Hugo Motta e Arthur Lira protagonizam uma rara convergência entre governo e oposição para a sucessão à presidência da Câmara.
A revista observa, aliás, que nas disputas pelas chefias do Congresso, a tendência é pela continuidade, e aparentemente em ambiente consensual. No cardápio de acomodações em que todos saem ganhando, especula-se que os atuais dirigentes Arthur Lira (Câmara) e Rodrigo Pacheco (Senado) serão agraciados com ministérios. Apesar de ser um político controverso, Arthur Lira tem cacife no cenário político nacional. Fiel aliado do ex-presidente Bolsonaro, o deputado alagoano foi a primeira autoridade a reconhecer a vitória de Lula em 2022. Era, naquele momento, um sinal de que a relação entre o governo e o Congresso, se não fosse das mais afinadas, seria no mínimo pacífica – e assim foi. Dois anos e alguns trancos depois, o balanço pode ser considerado positivo para os dois lados. Lula chegou à metade do mandato com suas principais agendas aprovadas, principalmente as econômicas, e os parlamentares continuaram com a prerrogativa de enviar às suas bases eleitorais 50 bilhões do Orçamento federal, apesar de toda a polêmica sobre transparência na destinação de recursos.
Essa bolada – informa “Veja” – ampliou a influência política e eleitoral dos congressistas e, ao que tudo indica, nada vai mudar. Nos últimos meses, Arthur Lira trabalhou pessoalmente para fazer o sucessor e apostou fichas em Hugo Motta, que transita bem entre gregos e troianos. No Senado, a bússola também aponta para a continuidade. Se nada mudar, Davi Alcolumbre, do União Brasil, substituirá Rodrigo Pacheco (PSD-MG) no comando da Casa. O parlamentar já esteve à frente do Congresso entre 2019 e 2021, comportou-se como um presidente virtual na gestão do senador mineiro, seu aliado de primeira hora, manteve dois ministros de sua cota pessoal no governo Lula e agora pavimenta seu retorno, inclusive já pensando na reeleição em 2027. Para concretizar o ambicioso projeto, Alcolumbre tem negociado algumas demandas com os colegas. Com os governistas, se comprometeu a evitar pautas que provoquem desgaste ao Palácio do Planalto. Para a oposição, disse que não vai se opor ao avanço dos projetos que tratam da anistia anto aos vândalos de 8 de Janeiro como ao ex-presidente Bolsonaro. Ele e Hugo Motta estão afinados e tocando de ouvido na conjuntura de poder que vai se inaugurar em 2025.