Desembargador José Ricardo Porto
O Globo de Ouro para Fernanda Torres na categoria Drama, pela sua atuação em “Ainda estou aqui”, filme de Walter Salles, premia a atriz brasileira, o elenco de uma forma geral e a produção cinematográfica. Mais do que isso, o prêmio serve, também, como exaltação da democracia e projeta para o mundo uma triste e dramática realidade que aconteceu no Brasil entre 1964 e 1985, época em que os direitos humanos foram violados em nome de um golpe militar.
“Ainda estou aqui” é um filme brasileiro de 2024, do gênero drama biográfico, dirigido por Walter Salles e protagonizado por Fernanda Torres e Fernanda Montenegro como Eunice Paiva em diferentes fases da vida, além do talentoso Selton Mello no papel de Rubens Paiva. O roteiro de Murilo Hauser e Heitor Lorega foi baseado na autobiografia homônima de 2015 escrita por Marcelo Rubens Paiva.
A trama retrata a história autobiográfica de Marcelo Rubens Paiva com enfoque na vida de sua mãe, Eunice Paiva, uma advogada que acabou se tornando ativista política na sequência da prisão e consequente desaparecimento de seu marido (em razão da qual também foi presa com uma de suas filhas, Eliana Paiva) pela ditadura militar brasileira. O marido de Eunice era o ex-deputado federal Rubens Paiva.
O filme não retrata tão somente a história de uma família. Retrata, na verdade, a história de uma nação. E de uma nação que foi vilipendiada em seus direitos mais básicos em nome de um golpe militar que provocou mortes, “desaparecimentos”, exílios e torturas de agentes políticos e do cidadão comum, de pessoas que ousaram, sobretudo, discordar do regime imposto pelo estado de exceção que dominou o Brasil até a eleição indireta de Tancredo Neves, em 1985.
Com o sucesso do filme de Walter Salles, o público internacional está tendo a oportunidade de conhecer a realidade brutal do golpe militar no Brasil. A competente direção da película, o desempenho de todo o elenco, principalmente de Fernanda Torres e Fernanda Montenegro, contribuem para isso.
Triste ver e constatar que uma minoria inexpressiva e fora da curva de militares tentaram reeditar o golpe militar em 2022. Inclusive com planejamento de assassinar o presidente eleito, Luís Inácio Lula da Silva, e ministros do Supremo Tribunal Federal, como Alexandre de Moraes.
Deram com os burros n´água. Os bons militares reagiram, impedindo mais um golpe contra nossa frágil democracia. Grande parte dos golpistas já estão presos e devem ir a julgamento, para a felicidade geral da Nação. Isso se deve a atitude de militares patriotas e das instituições brasileiras que não embarcaram na ilusão de mais um golpe de estado.
A estreia de “Ainda estou aqui”, aconteceu no Festival de Veneza, na Itália, em 1.º de setembro de 2024, tendo sido aplaudido por dez minutos consecutivos pelo público e rendendo aclamação à atuação de Fernanda Torres. Na ocasião, foi premiado com a Osella de Ouro de Melhor Roteiro.
Posteriormente, foi selecionado para mais de 50 festivais no mundo. Nos cinemas brasileiros, foi lançado oficialmente em 7 de novembro de 2024 e, mesmo tendo sido alvo de boicote da extrema direita brasileira, tornou-se um sucesso de bilheteria, com arrecadação de mais de 62,9 milhões de reais e mais de 3 milhões de espectadores até o momento. Foi incluso no Top 5 de melhores filmes internacionais de 2024 da National Board of Review e considerado um dos melhores filmes do ano pelas revistas especializadas BBC e Sight & Sound.
Depois de ganhar o Globo de Ouro para Fernanda Torres, o filme “Ainda estou aqui” tem grandes chances de ganhar também o Oscar, seja na categoria Filme Estrangeiro ou mesmo na de melhor atriz. Tanta repercussão internacional significa uma consagração para o cinema nacional e também um retrato para o mundo do que o Brasil viveu entre 1964 e 1985, além de um alerta para que continuemos vigilantes em defesa da democracia.